Há poucas semanas o brasileiro foi às urnas para eleger seus novos governantes na esperança de melhores rumos na economia do país. Aparentemente funcionou, já que segundo publicação do Infomoney, o Ibovespa futuro saltou até quase 1% e o dólar caiu 2,33%, acompanhados pelas taxas de juros futuros que também desabaram. O ADR – American Depositary Receipts, da Petrobras, disparou 14%. Em tempos de eleições conturbadas com disputas radicalizadas, estes resultados trazem uma tendência pouco observada, qual seja, a alteração de comportamento dos conceitos tradicionais.
Pesquisas diversas já mostravam anteriormente que 85% dos consumidores preferem adquirir seus produtos de empresas mais sustentáveis, com comprovada transparência tanto de atividades próprias quanto do ecossistema que está inserida. Portanto, hoje não basta ser honesta e estar em conformidade com as normas vigentes, mas vale também se preocupar com todo o entorno onde está inserida, verificar a regularidade e “fiscalizar” de forma saudável ambas as pontas (fornecedor e cliente). Tudo isso é ponto crucial para uma melhor aceitação mercadológica.
Essa tendência de transparência vem ganhando força em nosso país com a edição de novas normas de conformidade, as chamadas regras de “compliance”. Não é raro encontrarmos essas normas em vigência em várias agências reguladoras dos mais diversos segmentos como ANGEL, ANATEL, ANVISA, ANP, ANA, SRFB, BACEN, entre outras.
Os Estados, por sua vez, também já vêm adotando em suas legislações, normas de conformidade para seus contribuintes, e a exemplo do que ocorreu com o Espírito Santo, Mato Grosso, Minas Gerais e Rio de Janeiro, agora é a vez do estado de São Paulo editar sua lei de conformidade fiscal, e o fez através da Lei Complementar 1.320 de 2018. Essa lei foi editada em alinhamento com o órgão internacional TADAT – Tax Administration Diagnostic Assessment Tool, parceiro da União Européia, Japão, Suíça, Alemanha, Reino Unido, Noruega, entre outros, o que traz sinergia entre esses países e empresas, sejam elas de pequeno, médio ou grande porte, e que com eles tem algum tipo de relação comercial.
Mas a vantagem da lei complementar está muito além do alinhamento com órgãos internacionais, notadamente nos benefícios que ela pode trazer para contribuintes mais antenados, conforme veremos mais adiante.
A mídia especializada está dizendo que a lei vem separar o joio do trigo. Porem essa mudança serve para as empresas que realmente estão atentas a essa nova tendência, pois não é raro, também, encontrarmos empresas com diversas práticas de compliance, porém em total desalinhamento entre elas, o que impossibilita o uso do bônus legal.
A lei, traz em sua essência um caráter responsivo entre fisco e contribuinte buscando abrir um canal de comunicação até então inexistente e traz inovações para tanto. Viabiliza a realização de audiências públicas, uma das quais já ocorridas junto a instituição FGV, a fim de debater sobre as regras de procedimento da LC, buscando na sociedade profissionais especializados para opinarem e trazerem novas soluções.
Além disso, traz um formato de classificação de contribuintes privilegiando os mais adimplentes e em conformidade dentro da sua cadeia de fornecimento, gerando um critério que os classifica como A+, A, B, C, D, E e NC – Não Classificado. Todavia, esse novo sistema de classificação não é engessado e possibilita uma revisão periódica de acordo com a previsão do seu regulamento, da qual o contribuinte poderá se re-enquadrar dentro das categorias previstas.
O que chama a atenção na LC 1.320 é que o critério classificatório não leva mais em consideração apenas o índice de adimplência do contribuinte quanto ao pagamento de seus tributos estaduais, mas também a contumácia no cumprimento de obrigações acessórias e, principalmente, o grau de relacionamento com fornecedores regulares e em conformidade fiscal. Essa nova regra não foge à tendência atual de regular o compliance não apenas nas atividades da empresa avaliada, mas também de toda sua cadeia de fornecimento. Ou seja, a avaliação e a preocupação ocorrem em todo o ecossistema onde ela está inserida.
Dentre os principais benefícios que as empresas mais bem classificadas poderão gozar estão: 1) Autorregularização em substituição à lógica do Auto de Infração; 2) Autorização para apropriação de crédito acumulado com a observância de procedimentos mais simples; 3) Efetiva restituição do imposto pago antecipadamente por conta da substituição tributária através de procedimentos simplificados; 4) Autoriza o pagamento do ICMS relativo à substituição tributária, com origem em outra unidade federada, onde o valor do imposto não foi anteriormente retido através da compensação em conta gráfica ou recolhimento por guia especial até o dia 15 do mês subsequente; 5) Autoriza o pagamento do ICMS relativo à importação de mercadoria oriunda do exterior por meio de compensação diretamente em conta gráfica; 6) Renovação de regimes especiais concedidos, por meio de procedimentos simplificados; 7) Inscrição de novos estabelecimentos com o mesmo titular no cadastro de contribuintes levando-se em consideração procedimentos simplificados; 8) Transferência de crédito acumulado para empresa não interdependente por meio de procedimentos simplificadosdentro das condições estabelecidas em regulamento, desde que gerado em período de competência posterior à publicação dessa lei complementar, respeitando o limite anual previsto no regulamento; 9) Autoriza a apropriação de até 50% do crédito acumulado observando-se procedimentos simplificados.
Por ser inovador, o texto da lei pode parecer complexo e confuso a um primeiro momento, e até trazer desconfiança quanto a praticidade de sua implantação, porém o fisco vem trazendo mudanças consideráveis ao abrir o debate ao setor privado para esclarecer, elucidar e até buscar novas orientações para regular os procedimentos da lei, o que a nossos olhos é um ponto bastante positivo.
Vale ao empresário atento buscar se organizar e criar uma política de conformidade própria, certo que, como já mencionamos, grande parte das empresas já possuem essa prática, mas não estão alinhadas em políticas próprias.
Um diagnóstico que avalie o grau de maturidade da sua empresa pode facilmente apontar o nível que ela se encontra e quais os alinhamentos necessários para um melhor aproveitamento da Lei Paulista, assim como, outras vantagens que as normas de conformidade podem oferecer.
André Brunialti: Advogado especialista em Gestão de Risco Empresarial, Jurídico, Planejamento Tributário, Contencioso Fiscal e Recuperação de Tributos, além da Área Societária com Estruturação de Quadros Sociais, Sucessões e Proteção Patrimonial.